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Da pragmática, por Jaime Medeiros Júnior
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Neste segundo semestre de 2011 alguns dos meus mitos pessoais, que ergui nos últimos anos, acabaram por ir a breca. Entre eles o de que o primeiro semestre do ano, cinematograficamente, é melhor. Fato que me parecia observável, pelo menos, nos últimos 5 ou 6 anos. A mim parecia que os melhores filmes eram sempre os do primeiro semestre. 2011 me desmentiu isso [ Meia-noite em paris, O conto chinês, Medianeras, Copacabana e por fim o extraordinário A árvore do amor – é bom sempre lembrar o que nos pode causar o salto indutivo ao tentarmos erguer leis a partir da simples observação empírica dos fatos ].
Depois da nossa última prosa, fiquei com uma vontade grande de eleger o pragmático como o bandido da história. Mas o todo daquela nossa prosa já acusava que assim não podia ser. Bandidos parecem só ser plausíveis nas telinhas ou telonas, ou nas páginas dos nossos diários. As coisas quando pensadas ou vividas teimam em não se contentar com dualismos. E, por sorte, no curso dos livros a ler neste segundo semestre, depois de ter presenciado o lançamento, na palavraria, da tradução da Obra completa da poeta chinesa Yu Xuanji [mais uma mostra do quão extraordinário tem sido este segundo semestre de 2011]; acabei por retomar a leitura da História do pensamento chinês de Anne Cheng [Vozes], o que me obrigou a repensar a situação deste modo:
No ocidente o pragmático impôs ao contingente um método, um método que nos ensinou a descrer, método que, por fim, culminou no advento do nada e que nos obrigou a uma total desvitalização das coisas do mundo. Aqui, o método nasce do logos, subjuga o mundo e o dispõe em alternativas antagônicas, que só se tornarão válidas na medida que já estiverem previstas nos princípios. A razão contudo não consegue nos conduzir pra além de si. O outro está perdido, acabando por ficarmos apenas com o que dele se diz.
E no oriente, contudo, havemos também de nos deparar com o pragmático, mas lá ele não tomou o bonde do logos. Ali o método é, em sua inteireza, o se acercar da realidade, a sua atitude não é desconfiada. Rondamos aquilo posto ao centro. Sabemos que ali há um outro, que não poderá ser reduzido a um conceito, a uma palavra. Nos deparamos com o todo, com o símbolo, com o vazio. E cabe dizer: o vazio, diferente do nada, é um encontro, porque estamos diante do outro, afetuosamente acolhido e limpo de nossos conceitos.
Dito isto, parece que podemos seguir pensando a atitude pragmática. Sem ter de pô-la junto da escória do mundo.
Um abraço
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Jaime Medeiros Jr. é poeta portoalegrense (1964), pediatra. Autor do livro de poemas Na ante-sala. Colabora no blog Filhos de Orfeu e mantém o blog de crônicas Tênues Considerações.
A prosa ligeira de de Jaime Medeiros Jr. aparece neste blog quinzenalmente às quartas-feiras.
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