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Estantes, por Carla Osório
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Pois muito bem, resolvi passar um anti-cupim em uma das minhas estantes, logo aquela da sala. Tirei todos os livros, empilhei em vários lugares e agora olho para eles e me dá uma agonia, aquela bagunça toda me deixa angustiada: será que Borges está ao lado ou sobre Sábato; Vargas Llosa ao lado de Garcia Marquez? Esses equívocos seriam imperdoáveis, eles se rebelariam contra a ordem estabelecida autoritariamente ou me desprezariam por colocá-los juntos em posição tão incômoda, ou ainda pior: ordenariam um ataque de cupins e traças a todos os livros!
Preciso arrumar a estante e resolver essas pendências, deixá-los (os livros) tranquilamente intranquilos. É algo como organizar os pensamentos depois de um susto ou um trauma qualquer. Preciso de ordem e método, como diria Poirot. Mas também me pergunto se as estantes do detetive Espinoza (personagem das novelas policias de Garcia-Roza) não seria um modo mais prático de resolver esse assunto (o das estantes e seus respectivos cupins).
Espinoza faz estantes com os próprios livros: primeiro na vertical, depois na horizontal, depois novamente na vertical e assim por diante. Seria uma forma interessante, consigo imaginá-la até com uma certa graça. Mas e se eu resolvesse reler um livro que está na horizontal, como ficariam todos os de cima? Caíriam? Certamente sim, talvez fizessem uma ou duas concessões pra mim e durante um certo tempo. Mas no final das contas acabariam por me deixar com uma pilha desarrumada e provavelmente machucada. E alguns machucados de quedas são irreversíveis, principalmente quando se trata daquelas brochuras mais antigas, ou pior daquela nova edição de Guerra e Paz (belíssima, objeto de desejo e puro fetiche publicado pela Cosac Naify).
Pronto: problema resolvido, as estantes do Espinoza não são pra mim, portanto voltarei àquela questão que não quer calar: ao trabalho e arrumar essa biblioteca!
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Carla Osório é sócia-proprietária da Palavraria.
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