.
01, segunda, 19h: Lançamento do livro No coração do mundo: Paisagens transculturais, de Denílson Lopes (Editora Rocco). Bate-papo do autor com Marcus Mello.
Um dos tradicionais conceitos de nação é o de uma comunidade política autônoma e de território definido que partilha instituições comuns (constituição, governo, sistema judiciário). Ou o de uma comunidade de indivíduos ligados por identidade de origem, língua, costumes, religião. Atualmente, no entanto, as nações tiveram suas fronteiras rompidas e extrapoladas: culturas, línguas e costumes dialogam constantemente em um processo permanente de diáspora. Reina, portanto, um desejo cosmopolita de estar no mundo, mas sem, no entanto, deixar de estar no local. É desse entre-lugar, marcado pelo apagamento de fronteiras espaciais ou temporais, que o professor da Escola de Comunicação da UFRJ, Denílson Lopes, lança um olhar lúcido e sem nostalgia sobre as questões culturais da atualidade, notadamente a produção cinematográfica
Nos 10 ensaios de No coração do mundo, Denilson Lopes se apoia e inspira-se na noção de interculturalidade – o fato de dar importância cada vez maior aos trânsitos não só geográfi cos, mas às viagens feitas pelos meios de comunicação de massa – para estudar como se dá a hibridização multicultural a partir da análise de obras do cinema contemporâneo. O pesquisador traça um diálogo profícuo com as ideias de Silviano Santiago, Nestor Garcia Canclini e Arjun Appadurai, entre outros nomes, para mapear de forma original a produção cinematográfi ca dos últimos vinte anos.
No material de análise de Lopes, estão os filmes de Claire Denis, Wong Kar-Wai, Jia Zhang-ke, Abderrahmane Sissako, Wim Wenders, Lucrecia Martel, Pedro Costa, Béla Tarr, Lisandro Alonso, Tsai Ming Liang, Hou Hsiao-Hsen, José Guerín, Karim Aïnouz, Esmir Filho, entre outros. Nessas obras, o autor busca ver a maneira como os meios de comunicação levaram os processos de trânsito entre culturas bem além dos vocabulários cunhados a partir dos estudos de fluxos migratórios e diásporas. “Fui em busca de algo que estava na minha cabeça, em parte na África subsaariana, em alto-mar, no Taiti, onde as fronteiras são apagadas sem deixarem de existir, nas músicas latinas ouvidas em Hong Kong… Lugares a que nunca fui. Lugares a que os filmes me trouxeram”, afirma.
A partir de personagens desprovidos de referenciais espaciais, temporais ou reflexivos, que não mais remetem a um cinema nacionalmente engajado ou revolucionário, como nos anos 1960, Denilson Lopes aponta para um território de fronteiras quase invisíveis habitado por pessoas comuns. Assim, ultrapassando o conceito de cultura nacional, o autor acolhe o homem comum em diferentes paisagens culturais para falar sobre temas como a fragmentação e o fi m das utopias. E mostra como o fl uxo de mercadorias, informações e tecnologia contemporâneo passou a interferir no cotidiano deste homem, que vive no coração do mundo, espaço descentrado dos afetos. Para além do cinema, o autor incorpora refl exões que dialogam com a literatura, o teatro e as artes visuais como um todo. Para além de noções como nação, obra e autor, trata-se da defesa de uma visão comparativa e cosmopolita da arte contemporânea.
Denílson Lopes é professor da Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro, pesquisador do CNPq e autor de A delicadeza: estética, experiência e paisagens (Brasília, EdUnB, 2007), O homem que amava rapazes e outros ensaios (Rio de Janeiro, Aeroplano, 2002) e Nós os mortos: melancolia e neobarroco (Rio de Janeiro, 7Letras, 1999), organizador, ao lado de Andréa França, de Cinema, globalização e interculturalidade (Chapecó, Argos, 2010) e organizador de O cinema dos anos 90 (Chapecó, Argos, 2005).
Marcus Mello é pesquisador e crítico de cinema, editor da revista Teorema.
.
.
.
.
.
.